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Publicado em: 04/03/2010
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Moradores de favelas aprendem a combater doenças causadas por artrópodes

Vinicius Zepeda

Divulgação/Amapan 

         
     Morro do Queto: população carece de serviços, como saneamento,
     coleta de lixo e programas sociais, e ainda sofre com falta de água 

No bairro de Sampaio, Zona Norte da cidade, num terreno íngreme, sinuoso, cortado por trilhas no meio do mato e vielas onde antes havia uma pedreira, localiza-se o Morro do Queto, favela onde vivem cerca de três mil e oitocentas pessoas. Localizada na principal via de acesso da região para o centro da cidade, entre as comunidades do Morro de São João e dos Macacos, está vulnerável a invasões e trocas de tiros. Por ficar distante dos "bairros nobres" da cidade e de difícil acesso mesmo a pé, a comunidade carece de serviços públicos básicos, como saneamento, coleta de lixo e acesso a programas sociais dos governos, e ainda sofre com a falta de água. Ali, o único trabalho social existente é feito pela igreja e pela Associação de Moradores e Amigos da Rua Professor Antenor Nascentes (Amapan). O espaço lembra uma favela do começo do século passado, com casas de tábua e papelão, e onde os programas de urbanização ainda não chegaram. Com esgoto correndo a céu aberto, um lixão ainda serve de terreno fértil para a proliferação de doenças causadas por certos artrópodes – invertebrados que apresentam exoesqueleto e patas articuladas, e incluem, além dos inofensivos crustáceos, insetos, como baratas, pulgas, piolhos, mosquitos, percevejos, chatos, pulgas, moscas e formigas; aracnídeos (aranhas e carrapatos); escorpiões e quilópodes (lacraias), estes sim causadores de inúmeros problemas de saúde em humanos.

Para minimizar o problema, uma parceria entre pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Amapan desenvolveu um trabalho de conscientização sobre o risco de doenças. O projeto, que conta com o auxílio do edital Apoio à Difusão e Popularização da C&T no estado do RJ, da FAPERJ, tem coordenação da doutora em biologia parasitária Teresa Cristina Monte Gonçalves. Além do Morro do Queto, o trabalho da equipe envolveu também outra comunidade da Zona Norte, o Morro do Salgueiro, no bairro da Tijuca, onde vivem perto de quatro mil pessoas. "Apesar das semelhanças, vale ressaltar as diferenças entre as duas comunidades. O Salgueiro localiza-se no coração da Tijuca, próximo à praça Saens Peña. Por ser urbanizado, é possível chegarmos até o topo da favela de carro, em ladeiras asfaltadas. O espaço é atendido por várias Organizações Não-Governamentais (Ongs) e iniciativas do poder público", explica Teresa. "Nosso objetivo foi conscientizar moradores, professores e agentes comunitários de ambas as comunidades sobre os riscos de doenças transmitidas por certos artrópodes. No caso dos professores, os preparamos para agir como multiplicadores de nosso projeto", acrescenta.

Centers of Diseases Control 
   
Comum nas duas favelas, percevejo de cama se alimenta
de sangue humano e sua infestação é de difícil controle

Durante esses encontros, especialistas da Fiocruz proferiram palestras sobre diferentes artrópodes, sanando dúvidas de acordo com as demandas dos moradores. "Até mesmo questões que não faziam parte do projeto foram respondidas, como dúvidas sobre a gripe A", afirma Teresa. No Queto, chamou a atenção dos pesquisadores uma maior dificuldade de contato com os moradores devido às condições bem à margem da sociedade em que se encontram. "Como a carência de serviços básicos ali é praticamente total, eles eram bem desconfiados de nossas intenções e, às vezes falavam de suas dificuldades de maneira tensa. Ali, observamos uma dificuldade de conscientização da população relativa a todos os pontos abordados. Algumas moradoras questionavam: 'Eu já larguei mão de cuidar do lixo da minha casa. Para que perder tempo com isso se a minha vizinha não faz a parte dela?' Daí tivemos que explicar a elas que o exemplo de uma única pessoa podia influenciar os outros", recorda Teresa.

Passada a desconfiança inicial, muitos no Morro do Queto perguntaram sobre o que fazer com os ratos, que são mamíferos e não artrópodes, mas também são bem comuns por lá. Por situar-se em cima de uma pedreira, com lixo e esgoto a céu aberto, a comunidade é propícia à proliferação desses roedores, que acabam dividindo o espaço com a população. "Eles falavam sobre os ratos como parte de seu cotidiano, perguntavam por que a ratazana andava colada às paredes e a diferença entre ela e o rato do telhado. Outros relatos contavam de roedores entrando pelos buracos das casas e atacando os moradores", continua.

Tanto no Queto quanto no Salgueiro muito se falou de piolhos, baratas, mosquitos, carrapatos, moscas e formigas. "No caso das formigas, surpreendeu muita gente nas duas comunidades, que não se importavam em comê-las e repetiam a crendice popular de que fazem bem à vista. O que muitos não sabem é por onde elas passam até chegar em suas casas. Ao caminharem sobre comida estragada e lixo, elas podem carregar micróbios e bactérias nas patas. Infecções, reações alérgicas, disenteria e verminoses podem ser provocadas por esses insetos", afirma Teresa.

Divulgação / Fiocruz 

   
    Para Teresa e Willian, o projeto serve para aproximar
    moradores de favelas de grandes centros de pesquisa
Artrópode comum nas duas favelas, mas pouco conhecido de seus moradores, é o percevejo de cama. Sua infestação é de difícil combate, uma vez que são menores do que uma unha e põem muitos ovos. "Eles se escondem nas dobras das calças, na roupa de cama e à noite se alimentam de sangue. Como são pequenos, muita gente nem os vê. Porém, eles picam e causam alergia, insônia e stress. Só uma limpeza minuciosa e a eliminação dos ovos para acabar com eles", ensina.

Já no Salgueiro, os mosquitos e o piolho foram os mais debatidos pela população local. "Nesses casos, destacamos a importância da boa higiene nos cabelos das crianças durante o banho e da constante inspeção da cabeça dos filhos pelos pais", lembra Teresa. "Também ensinamos um remédio caseiro mais barato do que os xampus especiais de farmácia: lavar com água e vinagre e usar pente fino."

A ideia do projeto surgiu inicialmente de uma proposta idealizada pelo doutorando em entomologia médica Willian de Almeida Marques. "Já desenvolvíamos um trabalho semelhante voltado para a capacitação de agentes de saúde no combate à doença da Chagas em municípios de Tocantins e depois começamos a realizá-lo no Rio de Janeiro. Como aqui no município não há casos da doença, resolvi fazer um projeto semelhante, com outros artrópodes", explica Willian Marques. Além de participar da equipe coordenada por Teresa Cristina – que contou ainda com mais seis participantes fora especialistas convidados para as palestras –, o futuro doutor foi responsável por articular os contatos com as duas comunidades. "No caso do Salgueiro, apesar de não morar lá há muito tempo, nasci e fui criado naquela comunidade, onde mantenho amigos e laços até hoje. Já a escolha do Morro do Queto se deveu à admiração que nutria pelo trabalho dos moradores ligados à Amapan. Devido às precárias condições de vida na comunidade, qualquer trabalho feito ali é realmente de formiguinha", complementa.

Num primeiro momento, o trabalho foi realizado por meio de palestras e distribuição de folhetos explicativos aos moradores das duas favelas, na maioria mulheres e crianças. Numa segunda etapa, professores e agentes comunitários locais fizeram um curso com especialistas nas dependências da Fiocruz para poder atuar como multiplicadores do projeto. "Eles também ganharam uma apostila explicativa para usar em eventos futuros, como palestras, feiras de ciências, dias de conscientização, que planejem realizar", afirma Teresa. Para ela, o projeto desenvolvido pela equipe também ajuda na aproximação das pessoas com centros de pesquisa, que deixam de ser vistos como inatingíveis. "Esse foi o último ponto comum entre o Morro do Salgueiro e do Queto. Deixamos o diálogo aberto para que eles entrem em contato com especialistas da Fiocruz, da Secretaria Municipal de Saúde e demais órgãos públicos", destaca. "O projeto já está sendo encerrado, mas, ainda assim, têm surgido pedidos para novas palestras nas escolas locais, que pretendemos realizar", conclui.

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