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Publicado em: 01/09/2005
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Pesquisa resgata trajetória do grupo teatral Nós do Morro

Vinicius Zepeda

O teatro foi uma paixão de primeira hora na vida de Marina Henriques. Em 1997, com o propósito de levar um pouco da arte do palco às comunidades de baixa renda, a jornalista passou a atuar como professora de teatro em projetos sociais realizados por organizações não-governamentais (ONGs). Mas foi em 2003 que ela, ao lembrar dos tempos de estudante de jornalismo na Uerj e de uma entrevista que fizera para uma publicação da universidade, teve a idéia de realizar uma pesquisa que daria um novo rumo às suas atividades profissionais: investigar a trajetória do Nós do Morro, grupo teatral formado por moradores do Morro do Vidigal – comunidade pobre situada entre os bairros do Leblon e São Conrado na Zona Sul do Rio.

A referida entrevista, com o ator Luciano Vidigal, integrante do grupo, fora um dos momentos marcantes de sua passagem pela universidade. E a sua lembrança, o estalo que faltava para alavancar a idéia. Nascia, então, o projeto de pesquisa Nós do Morro – percurso, impacto e transformação. O grupo de teatro na favela do Vidigal”. Em 2004, a pesquisa ganhou impulso quando Henriques foi contemplada pelo programa Bolsa Nota 10 da FAPERJ.

“A experiência e o contato com essas comunidades acabaram me levando à idéia de desenvolver uma pesquisa que me ajudasse a responder perguntas acumuladas durante os anos de prática nessas localidades”, conta Henriques. De acordo com a pesquisadora, a escolha do Nós do Morro não se deveu unicamente pela forte lembrança do relato de Luciano Vidigal. O principal motivo da escolha do grupo foi o fato de o grupo teatral ter nascido de uma iniciativa dos próprios moradores do morro.

Henriques lembra que todas as experiências de que participou como professora de teatro em favelas do Rio haviam sido implantados por ONGs dentro dessas comunidades, mas não representavam uma manifestação própria dos moradores envolvidos. “Mesmo que em todas elas a adesão de crianças e adolescentes tivesse sido surpreendente, eu estava interessada em estudar uma iniciativa que representasse um movimento legítimo da comunidade”, afirma.

 

O Nós do Morro surgiu em 1986 a partir da parceria de alguns artistas que moravam no bairro do Vidigal, como Guti Fraga – principal idealizador do grupo –, Fernando Mello da Costa e Fred Pinheiro, com moradores da área considerada como favela, situada na encosta do morro. Assim, os artistas, que moravam em prédios na parte baixa passaram a interagir com os moradores da parte alta, entre eles Luís Paulo Corrêa e Castro, que acabou se firmando como dramaturgo do grupo.

 

Com o tempo, a troca de experiências entre os dois grupos se transformou num movimento próprio da comunidade. “Acredito que o resultado prático da atuação do grupo dentro do Vidigal seja a formação de uma platéia numerosa e fiel”, avalia a pesquisadora. Para ela, o Nós do Morro se transformou numa referência de lazer e cultura para os moradores da comunidade. “Em 1989, Guti Fraga levantou informações que davam conta de que 90% do público que assistira ao Biroska, terceiro espetáculo montado pelo grupo, havia ido ao teatro pela primeira vez para uma apresentação do Nós do Morro”, revela Henriques.

 

A pesquisa de Henriques teve início no segundo semestre de 2003, quando ela ingressou no mestrado em Teatro na Uni-Rio. À época, a pesquisadora acompanhou os ensaios do Nós do Morro durante a montagem do espetáculo Burro sem rabo – que retratava o universo dos catadores de lixo. Nesse mesmo ano, o grupo mudou sua metodologia e definiu que todas as turmas de seu curso de teatro, inclusive as de iniciação e formação, deveriam abordar sempre a mesma temática em uso pela companhia. A partir daí, a jornalista resolveu, então, entrevistar também alunos de duas turmas de iniciação teatral.

 

Durante o desenvolvimento de seu projeto, a pesquisadora pôde constatar que a vivência obtida por alunos da companhia contribuiu para alargar seus horizontes e possibilidades profissionais que, antes, não enxergavam. Um dos exemplos que mais marcaram Henriques foi o de Rosana Barros, atriz da companhia e filha de imigrantes nordestinos – a mãe empregada doméstica e o pai vendedor de carne. A atriz reconhece sua transformação: “Antes de entrar para o grupo, eu era um pouco acomodada. Hoje, quando me deparo com um problema, ao invés simplesmente dar a volta, eu vou em frente e corro atrás”, diz Barros.

A afirmação de Rosana é compartilhada por sua colega de palco Roberta Rodrigues. “As minhas amigas acreditavam que o universo delas era isso aqui, o Vidigal. Elas achavam que nunca sairiam daqui; que jamais conseguiriam algo melhor, que simplesmente moram no morro e não têm grana. Aqui, eu aprendi a seguir meus objetivos, sempre, e jamais achar que sou inferior”, diz Rodrigues.

 

Reconhecido pela crítica especializada, o talento do Nós do Morro motivou a construção do Teatro do Vidigal, com capacidade para 80 pessoas e inaugurado em 1996 com recursos de comerciantes da comunidade e do Conselho Britânico. Foi em 1997, com a montagem das peças Abalou, Machadiando e É proibido brincar na casa de Cultura Laura Alvim, que o grupo iniciou suas temporadas também fora do Vidigal. A companhia também já coleciona alguns troféus do Prêmio Shell de Teatro e diversos atores egressos do grupo já participaram de novelas, comerciais e filmes brasileiros. O mais conhecido deles é o ator Douglas Silva, que fez o personagem Zé Pequeno quando jovem no filme Cidade de Deus, do diretor Fernando Meireles, e o personagem Acerola da série Cidade dos Homens, da Rede Globo.

 

Para Marina Henriques, que pretende, em breve, ingressar no doutorado e aprofundar seus estudos sobre o Nós do Morro, a transposição dos limites do Vidigal e o diálogo criado com a comunidade é uma mostra do talento do grupo e da eficácia do trabalho. A pesquisadora destaca a qualidade artística da companhia como um grande diferencial. “Foi um projeto que teve como ponto de partida a idéia de oferecer acesso à arte, e não ‘salvar crianças e jovens da marginalidade’, discurso muito utilizado para promover projetos do Terceiro Setor”, conclui.

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