Por Ascom Faperj
Ilustração do nanorreservatório na célula cancerosa no momento em que ele é acionado por prótons para abrir a tampa e liberar o fármaco |
Um grupo de 11 pesquisadores brasileiros assina um artigo, publicado semana passada, sobre o desenvolvimento de um nanorreservatório que contém um fármaco anticâncer e fica preso nos seus poros por um nanogate, uma espécie de "tampa". O nanorreservatório funciona mediante um comando externo, neste caso, acionado por prótons. O artigo saiu na conceituada revista Journal of Materials Chemistry B, da Sociedade Real de Química do Reino Unido, cujo fator de impacto é 5,047, da Royal Society of Chemistry, uma sociedade fundada em 1848 responsável pelo incentivo às ciências químicas.
A parceria entre a professora Célia Ronconi, da Universidade Federal Fluminense (UFF), e pesquisadores do Programa de Carcinogênese Molecular do Instituto Nacional de Câncer (Inca), chefiado por Luis Felipe Ribeiro Pinto, e do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) mostrou uma eficácia surpreendente.
"Investigamos a liberação do fármaco no núcleo de células de câncer de mama sob o comando de prótons e o resultado foi excepcional. Houve uma redução de 92% da viabilidade das células de câncer. O dispositivo carregado foi mais tóxico para as células de câncer do que o fármaco puro na mesma concentração", relatou a professora, que recebe apoio da FAPERJ para a realização de suas pesquisas, por meio do programa Cientista do Nosso Estado. Ela também contou com recursos de outro edital da FAPERJ na pesquisa em questão, o Programa de Apoio às Instituições de Ensino e Pesquisa Sediadas no Estado do Rio de Janeiro. O professor Ribeiro Pinto, do Inca, também foi contemplado no programa Cientista do Nosso Estado.
Funcionamento do dispositivo
O grupo da UFF trabalha com o desenvolvimento de dispositivos que respondem a um comando para liberar fármacos. Este comando por ser luz, campo magnético, reações de oxirredução ou variação de pH. O pH de células de câncer é mais ácido e, dependendo da célula, pode variar de 4.5 a 5.5. Assim, os pesquisadores projetaram um nanorreservatório que armazenasse o fármaco e também projetaram uma espécie de "tampa" (nanogate) para fechar o reservatório e evitar o vazamento do fármaco. A tampa só abre para liberar o fármaco quando o meio está ácido (pH < 7), ou seja, na presença de prótons. Em meio básico (pH > 7), o dispositivo permanece fechado. A ideia é que o dispositivo só libere o fármaco no interior de células de câncer onde o meio é ácido. Além disso, o grupo fez testes de liga/desliga com esse nanorreservatório, que consistiu em adicionar ácido para atingir o pH de 5,5 e liberar o fármaco (liga), em seguida, adicionam base para aumentar o pH para 7,4 (fisiológico) e o dispositivo é, então, fechado, cessando a liberação do fármaco (desliga). Este sistema funciona como se fosse uma válvula em escala nanométrica.
A professora Célia Ronconi entre os pesquisadores Evelyn C. S. Santos e Thiago Custódio dos Santos (Foto: Divulgação) |
Nos experimentos, o grupo testou a doxorrubicina, um fármaco tóxico para células sadias. A próxima etapa do trabalho é verificar se o nanorreservatório, sem o fármaco, é tóxico para as células sadias.
"Nós verificamos que o reservatório sem o fármaco (doxorrubicina) apresenta baixa toxicidade para as células de MCF-7 de câncer de mama, mesmo em altas concentrações. Isto é um indicativo de que ele não seria tóxico para células sadias, mas nós não testamos em células não tumorais. Estes ensaios serão feitos futuramente", explicou Célia.
No estudo, os pesquisadores testaram a linhagem de células do tipo MCF-7, oriunda de um adenocarcinoma de mama, isolado em 1970, de um tumor de uma mulher branca, de 69 anos de idade. O acrônimo se refere ao instituto onde as células foram isoladas: Michigan Cancer Foundation-7. A pesquisa levou aproximadamente dois anos e foi parte do trabalho de doutorado de Evelyn C. Santos, aluna da UFF.
O estudo foi feito in vitro, mas como os resultados foram surpreendentes, o grupo pretende seguir adiante em investigações in vivo. Como as células tumorais utilizadas são de origem humana, o grupo pretende usar camundongos imunodeficientes para os ensaios. O dispositivo para outros tipos de câncer ainda não foi testado, mas acreditam que poderia ser adaptado para vários tipos de tumores sólidos.
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