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Publicado em: 18/11/2004
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Mulheres cientistas da América Latina debatem obstáculos em comum

Marina Lemle

O Rio de Janeiro está sendo palco, esta semana, de intensos debates sobre as barreiras que dificultam uma maior participação de mulheres latino-americanas na ciência, e em especial nas áreas de Exatas e da Terra, em que a presença feminina é significativamente baixa. As discussões acontecem no Congresso Mulheres Latino-Americanas nas Ciências Exatas e da Vida, que começou nesta quarta-feira, dia 17 de novembro, e vai até dia 19.

 

Apoiado pela FAPERJ, o evento conta com a participação de especialistas no assunto, como a senadora uruguaia Maria Julia Pou; a vice-presidente da Third World Organization for Women in Science (TWOWS), a cubana Liliam Alvarez Dias; e a ministra da Secretaria Especial de Políticas para a Mulher, Nilcéa Freire. A organização do Congresso ficou a cargo da coordenadora da área de Física da Fundação, Elisa Baggio-Saitovitch, pesquisadora do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, e Márcia Barbosa, do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que concedeu entrevista ao Boletim da FAPERJ na semana passada.

 

Além da pequena presença de mulheres nas Ciências Exatas e da Terra, outro fato bastante debatido pelas conferencistas nos dois primeiros dias do evento foi a maior participação feminina na base da pirâmide acadêmica e a inversão desse quadro à medida que se chega ao topo da carreira. Segundo a ministra Nilcéa Freire, a situação no campo político é parecida: as mulheres dificilmente chegam a cargos mais altos. “Avançamos muito no Brasil nos direitos formais, mas pouco em áreas em que é necessária a mudança da lógica do poder e da hegemonia masculina. Sem a participação de 52% da população brasileira – as mulheres – não haverá democracia ou desenvolvimento sustentável”, disse, para uma platéia formada unicamente por mulheres, quase todas cientistas.

 

Presente à mesa de abertura, o diretor-presidente da FAPERJ, Pedricto Rocha Filho, atestou o desequilíbrio entre as presenças feminina e masculina em atividades científicas apresentando dados computados em quatro editais Cientistas do Nosso Estado (de 1999 a 2002), voltado para pesquisadores em topo de carreira: entre os inscritos, 36% eram mulheres e 64% homens. Já entre os aprovados a diferença foi maior ainda: 74% de homens contra 26% de mulheres (gráficos abaixo). Por outro lado, ele revelou que há avanços em outros editais, como o do Programa Primeiros Projetos, e destacou a grande presença de mulheres nas reportagens do último número do Jornal da FAPERJ, em que mereceu destaque uma entrevista com a governadora Rosinha Garotinho.

 

 

Para Rocha Filho, a questão da participação da mulher na ciência não deve ser encarada como uma luta de gêneros, já que há muito espaço a ser ocupado em áreas que tratam do novo compromisso social da ciência e da tecnologia para o desenvolvimento econômico, social e ambiental. “Temas como a erradicação da pobreza, a harmonia com o meio ambiente e a educação precisam de uma maior atuação das mulheres”, exemplificou.

 

A física Elisa Baggio-Saitovitch lembrou que há mais cientistas mulheres no Brasil do que em outros países, mas que seu nível de qualificação não representa vantagem. Neste cenário, ela destacou a importância do debate sobre temas específicos que representam obstáculos na ascensão das carreiras científicas para mulheres e da união das cientistas latino-americanas de todas as áreas para a integração regional, o desenvolvimento e a ética.

Nilcéa: “Mulher introjeta padrões culturais”

Na mesa sobre “Políticas públicas para a mulher”, Nilcéa Freire disse, em tom descontraído, que a principal diferença entre homens e mulheres na ciência é um verbo no passado: “fui”. “O homem viaja para um congresso se o assunto lhe interessa. A mulher tem que avaliar a disponibilidade da empregada, da mãe, da sogra, para cuidar das crianças, planejar as compras do supermercado etc”. Ela também atribui a falta feminina nas áreas das ciências exatas e a discrepância entre a base e o topo da pirâmide acadêmica à introjeção, pela mulher, de padrões e processos culturais.

 

Nilcéa convidou as participantes a se integrarem em duas frentes de trabalho articuladas pela Secretaria Especial de Políticas para a Mulher junto com o Comitê de C&T do Governo: a organização de seminários conjuntos de núcleos que estudem a mulher para o desenvolvimento de programas de fomento induzido e a promoção de um concurso de monografias de graduação e pós-graduação sobre a participação de mulheres na sociedade. A Ministra concluiu sua fala lembrando que, em dezembro, será divulgado o Plano Nacional de Políticas para Mulheres, com quatro eixos básicos: saúde; educação cultura e C&T; violência; e autonomia econômica – igualdade no mundo do trabalho.

Hegel: “A mente da mulher não é adequada para as ciências mais elaboradas”

A senadora Julia Pou, integrante da Comissão de Educação, Saúde, meio Ambiente e C&T do Senado uruguaio, divertiu a platéia reproduzindo frases ditas desde a Antigüidade. Para Aristóteles (IV aC), por exemplo, “a mulher é um homem inferior”. Já Friedrich Hegel (XIX) achava que a mulher pode ser educada, mas sua mente não é adequada para as ciências mais elevadas.

 

“A mulher deve ter consciência de que o mundo mudou e acreditar que pode atuar na sociedade em todos os campos. Queremos, podemos e estamos dispostas a isso”, defendeu Julia.

 

Ela acrescentou que uma atitude positiva da mulher é fundamental. “Não devemos usar expressões como ‘o problema da mulher’ nem nos denominarmos como ‘minoria’. Nosso comportamento tem que ser construtivo, otimista e racional. Não queremos desculpas, e sim o dever de iluminar para progredir”, concluiu.

Cuba tem índices de mulheres na ciência mais altos que o resto da AL

A cubana Liliam Alvarez Dias projetou gráficos que mostram que a participação das mulheres na ciência em Cuba é maior do que no resto da América Latina. Enquanto os países latino-americanos têm, em média, 0,3 mulheres na ciência por grupo de mil, em Cuba o índice é de 1,8. Mesmo assim, a pirâmide de trabalho também mostra mais mulheres na força técnica (66%) do que nos cargos de dirigentes de universidades e centros de pesquisa (26%). “Em Cuba, as mulheres são ‘vices’”, ironizou. Ela destacou as campanhas da Unesco em âmbitos nacionais, regionais e mundial para a superação dos estereótipos de gênero e aumentar a participação das mulheres na C&T.

MIT aumentou 20% o salário de pesquisadoras

A vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Dora Ventura – lembrando que o presidente da entidade é homem –, relatou um fato ocorrido no Massachussetts Institute of Technology (MIT), nos EUA. Desconfiadas de que eram preteridas tanto em espaço físico quanto em nível salarial, pesquisadoras resolveram medir, com fita métrica, o espaço ocupado pelos homens e compará-lo ao ocupado pelas mulheres. Elas avaliaram também os rendimentos de cada gênero e compararam com suas experiências profissionais e acadêmicas. A conclusão foi que os homens tinham mais espaço e ganhavam melhor do que as mulheres, independente da sua sugerida (e inverídica) excelência.

 

O estudo resultou num pedido de desculpas oficial da faculdade e um aumento de 20% para as pesquisadoras. “Este exemplo seminal nos EUA foi espalhado pelos EUA, num processo lento de mudança”, concluiu Dora, acrescentando que não há nada parecido sendo feito no Brasil.

 

Com base em dados da Academia Brasileira de Ciências sobre pesquisadores de nível 1A do CNPq, Dora mostrou que as mulheres são minoria no topo da pirâmide da carreira acadêmica: são apenas 30%. A maior concentração de mulheres está nas áreas de artes, comunicação, ciência da informação e história. “Precisamos ter um conhecimento detalhado dessa realidade”, sugeriu.

Amazônia tem boa representação de mulheres

A diretora técnica-científica e presidente interina da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam), Nidia Noemi Fabré, apresentou estudos sobre a presença feminina nos programas de fomento daquela Fundação, que, na média, chegam a um equilíbrio. Em 2004, revelou-se uma preponderância das mulheres nas áreas Humanas (56%), Biológicas (55%) e da Saúde (52%). Nas Ciências Exatas, a participação se limita a 22%. Ela mostrou outros dados interessantes: as mulheres participam mais de eventos (67%) e organizam mais eventos (60%), mostrando que têm um perfil de aproximação com a sociedade. Por outro lado, os homens fazem mais pós-graduação em outros estados (61%), o que mostra que se deslocam com mais facilidade.

 

Nidia contou que, além dela na Fapeam, a Amazônia também tem uma mulher à frente da Secretaria de C&T. “A Amazônia pode ser uma área piloto para ação, com a sustentabilidade ambiental sendo conduzida femininamente”, sugeriu.

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